“RETRATOS DO BARROCO” PREPARARAM RECRIAÇÃO HISTÓRICA NO MOSTEIRO DE AROUCA

por jcerca em 20 de Julho de 2018

Como preparação cultural para a edição de 2018 da Recriação histórica, a Câmara Municipal de Arouca, promotora deste evento desde 2004 (com interrupção de 2009 a 2013) organizou um vasto programa cultural que designou por “retratos do Barroco” e que tiveram lugar dentro dos diversos espaços conventuais, durante uma semana.

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Durante esse período, os retratos foram vários, como vários foram os espaços em que eles foram tirados, mas o local foi sempre o mesmo: o Mosteiro de Arouca.

Retrato musical

Foi com um retrato musical, com relevo para a polifonia vocal, que este conjunto de eventos culturais abriu no dia 13 de julho. Num cenário ricamente barroco, como é o cadeiral do Mosteiro de Arouca, coube ao grupo “Cupertinos” deliciar todos os presentes com a beleza da harmonia vocal dos seus 8 elementos.
Com um reportório de temática totalmente mariana, o programa deste concerto foi todo ele dedicado ao compositor português Pedro de Cristo (1550-1618) considerado um dos mais importantes polifonistas portugueses dos séculos XVI e XVII e foi integrado no 4º centenário da sua morte.

IMG_5554No final do concerto e depois de vivamente aplaudida a sua atuação, o grupo brindou o auditório com o trecho “Benedicamus Domino” do compositor Aires Barbosa e cuja partitura se encontra no famoso “Códice polifónico de Arouca”, guardado  no Museu de Arte Sacra, ao lado de muitos outros manuscritos musicais de grande valor documental e histórico. Trata-se de um livro de música polifónica copiado originalmente entre a primeira e segunda décadas do século XVII, para ser usado pelas freiras do Mosteiro de Arouca nos ofícios litúrgicos desta comunidade cisterciense.

Retratos gastronómicos

Estes “retratos do barroco” proporcionaram ao púbico a oportunidade de descobrir não só os diversos espaços conventuais, mas também de poderem saborear a doçaria conventual e regional. Foi para isso que, durante todo o sábado, dia 14, esteve patente, nos claustros inferiores, uma mostra de licores e de doçaria conventual e regional, não só de Arouca, mas oriunda também de outras localidades do País.

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E para dar a conhecer ao público todo um vasto e rico património gastronómico, ligado à doçaria conventual e regional, disperso por todo o País, foi também apresentado na sala do Capítulo a Coletânea designada “A doçaria portuguesa – Norte”. Trata-se de um ambicioso projecto de Cristina Castro iniciado em 2015 com um trabalho de recolha por todo o País e que pretende registar, para memória futura, a riqueza de um vasto e diversificado património ligado á doçaria portuguesa. Neste momento estão prontos dois volumes, um sobre o Norte (157 doces) e o outro sobre o Sul do País (172 doces) Não se trata de um vulgar livro de receitas, mas sim de uma pesquisa sobre a origem desses doces, contendo o relato de algumas histórias de quem os confeciona e algumas curiosidades sobre as localidades onde foram recolhidos.

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Jantar barroco

Mas a gastronomia não se pode limitar à teoria, nem ficar apenas pela informação histórica, ou geográfica. Foi por isso que um dos pontos mais altos destes “retratos do barrocos” foi a realização de um jantar barroco nos claustros superiores do Mosteiro de Arouca.

Com uma ementa cuidadosamente preparada, de acordo com os costumes culinários da época barroca e com personagens rigorosamente trajados à moda da nobreza, este jantar barroco foi ainda animado com a recitação de poemas amorosos, bem como a execução de danças dessa época, interpretadas pelo grupo “Ensemble Portingaloise”, grupo criado em 2015 e que se dedica ao estudo, à reconstituição e à divulgação da dança europeia dos séculos XV a XVIII.

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Foi aliás, este grupo que orientou, na tarde deste dia, no espaço dos claustros superiores do Mosteiro,  um Workshop sobre a dança barroca francesa, e durante o qual, sob a orientação de  um dos seus elementos, foram ensinados e treinados alguns passos da dança tão praticada nos salões da nobreza daquela época.

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Teatralização do barroco

Depois do jantar barroco teve lugar, no belíssimo espaço da igreja conventual, uma encenação tendo como tema central a arte do barroco. Embora este espectáculo de teatro pouco ou nada tenha de religioso, a verdade é que foi utilizado este espaço conventual para enaltecer a beleza e a riqueza da arte barroca. E como demonstração dessa arte, nada melhor do que um espaço tão cheio de barroco, como o é a igreja do mosteiro de Arouca e o seu magnífico cadeiral.

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Este espectáculo designado por “Ventos da discórdia” foi realizado pelo grupo cultural e recreativo de Rossas em colaboração com o teatro de Montemuro.

Outros retratos

No variado programa que estes “Retratos do barroco” englobaram teve lugar, novamente, no cadeiral do mosteiro de Arouca, na noite de segunda feira, 16 de julho um recital de música barroca levado a cabo pelo grupo “Iberian Ensemble”, um quinteto que interpreta música barroca, com recurso a instrumentos característicos da época, tais como o cravo, o traverso, o fagote, o alaúde e o violoncelo barroco.

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E se no primeiro retrato musical deste programa cultural esteve em destaque a harmonia e a versatilidade da voz humana, aqui foi a vez de dar lugar aos acordes deste conjunto de instrumentos barrocos, que atuaram perante o silêncio do rei dos instrumentos, o órgão ibérico datado de 1743 e que pontifica neste magnífico espaço barroco.
Muito ligada à vida conventual está também a arte das iluminuras que ornamentavam muitos manuscritos produzidos nos Scriptorium monacais. Foi por isso que estes “Retratos do barroco” contemplaram também um atelier de iniciação à iluminura orientado por Tânia Pires do atelier Sabbath. Nesse atelier prático, os curiosos que nele se inscreveram aprenderam a elaborar as cores a partir de materiais naturais, tais como ovos e diversos pigmentos, aplicando-as, seguidamente, em trabalhos da sua criatividade. Esta sessão sobre iluminuras terminou com a aprendizagem da técnica de aplicação de folhas de ouro com o recurso a diversos mordentes.

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O vasto programa destes “Retratos do barroco” contemplou ainda uma palestra sobre  “o papel das boticas religiosas na sociedade portuguesa” que decorreu noutro espaço conventual, a Botica e que foi proferida  pelo diretor do Museu da Farmácia, João Neto.

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O programa terminou com uma visita-jogo inspirada na “Lenda da Rainha Santa Mafalda” e destinada aos mais jovens. Seguindo um roteiro que lhes foi distribuído no início da visita, junto ao fontanário dos claustros, os pequenos visitantes percorreram os mais emblemáticos espaços conventuais, recebendo em cada um deles alguns conhecimentos históricos, bem como algumas interessantes curiosidades sobre esses espaços. Uma maneira interessante, motivadora e pedagógica de dar a conhecer aos mais novos a história deste magnífico mosteiro cisterciense que orgulha todos arouquenses e delicia todos aqueles que o visitam.

José Cerca

 

Publicado no jornal “Discurso Directo” nº472 de  27 de julho de 2018

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